sexta-feira, 18 de abril de 2008

Epidemia da Beleza







Movidos pela vaidade, pelo menos 130 mil crianças e adolescentes submeteram-se, no ano
passado, a operações plásticas.
Qual a extensão desse servilismo à estética? A situação é mais grave do que se imagina.
Pesquisa feita pela MTV sobre o perfil dos jovens brasileiros de 15 a 30 anos de idade, divulgada na
quinta-feira, revela uma epidemia de preocupação com a beleza física.
Em parceria com o Datafolha, a MTV perguntou aos entrevistados, por exemplo, se trocariam
25% de inteligência pela mesma proporção de beleza. Resultado: 15% foram francos o suficiente para
admitir a troca. Nem se preocuparam com o fato óbvio de que a beleza física passa rapidamente, mas a
inteligência fica.
Fiquei me perguntando se os jovens dispostos à troca já não teriam um QI não muito elevado. A
julgar pela pesquisa, o problema não está no QI. Trata-se de um mal que afeta parte expressiva de uma
geração das classes A, B e C.
O principal resultado desse perfil é ter detectado até que ponto vai a reverência exacerbada à
beleza física. Convidados a definir os traços que melhor definem a atual geração, os entrevistados
colocaram em primeiro lugar – e bem na frente – a vaidade. Depois, aparecem o consumismo, o
individualismo e o comodismo.
Por que está ocorrendo essa “epidemia da beleza”? A resposta é óbvia – e nós, da mídia, somos
em parte responsáveis por isso.
Há uma supervalorização da aparência. Seres anoréxicos e fúteis, quase inumanos, são
apresentados como padrão de beleza e de sucesso. A mídia, por sua vez, não se limita a fotografá-los,
mas freqüentemente busca suas opiniões sobre os mais diversos temas, de política a transgênicos.
Dissemina-se um culto à celebridade, que dá lugar ao surgimento de uma espécie de casta na
sociedade, a casta dos “famosos”. E, para ser famoso, não é preciso necessariamente fazer algo de
relevante – basta aparecer.
É o domínio da fugacidade. A internet, na sua extraordinária velocidade em tempo real, é a
síntese tecnológica da voracidade do presente, do agora.
A pesquisa mostra, de um lado, o narcisismo entre jovens e, de outro, um ceticismo. São as duas
faces de uma mesma moeda. Políticos são sempre ruins, independentemente dos partidos.
O jeito, portanto, é o salve-se-quem-puder. Se não existem utopias – e toda utopia é um pacto
com o futuro – nem se acredita na política, sobra apenas a saída individual.
Até porque a mensagem predominante é a do consumismo como fonte de prazer e de realização.
As próprias relações pessoais acabam refletindo esse imediatismo individualista. “Ficar”
significa namorar sem estabelecer nenhum laço emocional – laços emocionais implicam compromisso.
“O próprio ficar já está derivando seu sentido para algo mais superficial, onde sentimentos, ainda que
momentâneos, já chegam a estar totalmente ausentes”. Servis ao ideal da beleza física, pais abrem mão
da condição de adultos, como se quisessem prolongar a adolescência. Não querem ser pais de seus
filhos, mas amigos. Não cobram, não dão limites, não exigem. O pai muito amigo é, porém, um
candidato a futuro inimigo do filho. “Os filhos já evidenciam certo desconforto com a ausência da
porção pai e o excesso do lado amigo”, observam os pesquisadores.
O culto à futilidade é não só um transtorno individual – em que a pessoa passa a viver apenas
em função do superficial e do fugaz – mas também um transtorno coletivo.
Em comparação com o levantamento realizado em 1999, houve uma redução do número de
jovens dispostos a realizar trabalhos comunitários. Explicável: na lógica do narcisismo, o outro só serve
de espelho. Será que essa onda vai diminuir? Talvez.
Registraram-se, nas conversas da fase qualitativa da pesquisa, sinais de esgotamento decorrentes
dessa multiplicidade de estímulos fugazes, sem laços. Começa-se a perceber que tudo, intenso e
imediato, resulta em nada.

Em meio a essa cultura da futilidade, tenho visto um movimento de resistência de jovens
que, atentos ao que ocorre ao seu redor, estão querendo fazer a diferença.Tenho visto também escolas e
educadores colocarem na prática escolar o estímulo à colaboração. Esse deveria ser o padrão de
comportamento, não a exceção, numa comunidade civilizada. Podem me chamar de nostálgico, mas, se
ser jovem é ficar obcecado pela beleza e viver em regime alimentar ou achar que se comunicar é ficar
na frente de um computador, prefiro ser velho. Sou dos que acham que um dos bons prazeres da vida é
ouvir, pessoalmente, sem tela nem terminais, conversa de gente falando das dores, delícias e
encantamentos das experiências.

:::Gilberto Dimenstein... Folha de São Paulo:::

Um comentário:

  1. Realmente quem vive por conta da beleza, não consegue viver bem, ser feliz,se amar um pouco
    Só vive se desvalorizando...
    O triste é ver adolescentes envolvidos nessa epidemia...
    sinceramente prefiro uma boa educação para não serem tão futeis amanha!!!

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